O cancelamento do plano de saúde após o período de remissão é ilegal

Mas, primeiro, você precisa saber do que se trata o “período de remissão”, quando se aplica e porque o cancelamento do plano após esse benefício é indevido.

É possível que o contrato do seu plano de saúde preveja que, em caso de morte do titular, os seus dependentes terão direito à remissão do pagamento da mensalidade do plano. Isso significa que, durante o período de remissão, os dependentes do titular ficarão isentos do pagamento da mensalidade, mas continuarão tendo direito a usufruir integralmente todos os serviços de saúde oferecidos pela operadora.

Percebe-se que a previsão da cláusula de remissão visa proteger o grupo familiar economicamente dependente do titular que vem a falecer, evitando que os dependentes fiquem desamparados nesse momento de extrema fragilidade.

A duração do período de remissão poderá variar de 1 (um) a 5 (cinco) anos e é importante que os dependentes fiquem atentos ao seu contrato, haja vista que o direito à remissão depende de expressa previsão contratual. Desse modo, havendo cláusula de remissão, a operadora do plano de saúde não poderá negar esse direito aos dependentes do titular falecido.

Feitas tais considerações, há um segundo ponto extremamente relevante sobre o benefício da remissão: trata-se do direito de os dependentes, decorrido o período de remissão, manterem o plano de saúde nas mesmas condições contratadas pelo titular falecido.

Os dependentes devem ficar atentos a isso, tendo em vista que é uma prática reiterada por parte das operadoras dos planos de saúde o cancelamento do plano após o período de remissão. Em muitas das vezes, o plano de saúde sequer notifica os segurados sobre o cancelamento e estes acabam só tomando conhecimento da rescisão contratual ao precisar utilizar algum serviço.

A proibição do cancelamento do plano após o período de remissão é prevista na Súmula Normativa n.º 13/2010 da ANS, que traz o seguinte texto:

O término da remissão não extingue o contrato de plano familiar, sendo assegurado aos dependentes já inscritos o direito à manutenção das mesmas condições contratuais, com a assunção das obrigações decorrentes, para os contratos firmados a qualquer tempo.

Ou seja, falecido o titular, após o período de remissão, bastará que a operadora do plano de saúde altere a titularidade do contrato já existente, passado o dependente a figurar como titular.

Não obstante se tratar de questão incontroversa, as arbitrariedades cometidas pelas operadoras dos planos de saúde ao impor o cancelamento do plano após a remissão impõem que os segurados tenham que se socorrer do Judiciário para manterem seus planos de saúde, o que é muito relevante que o façam, especialmente quando se tratar de contrato de plano de saúde individual-familiar.

Isso porque os contratos individuais-familiares praticamente não são mais comercializados pelas operadoras, uma vez que sofrem maior regulamentação protetiva em favor do segurado por parte da ANS, o que faz diminuir as chances de ingerências e os lucros das operadoras (por conta da limitação dos reajustes anuais, por exemplo). Então, a perda de um contrato dessa espécie tende a representar um prejuízo ao consumidor que, provavelmente, ficará condicionado à contratação de um plano de saúde coletivo ou empresarial, cujas mensalidades costumam aumentar exasperadamente em pouquíssimo tempo.

Acerca do entendimento jurisprudencial sobre a matéria, o próprio Superior Tribunal de Justiça tem entendimento sólido pela impossibilidade de exclusão do dependente após a remissão:

AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. PLANO DE SAÚDE. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. NÃO OCORRÊNCIA. FALECIMENTO DO TITULAR. MANUTENÇÃO DE DEPENDENTE, APÓS O PRAZO DE REMISSÃO, MEDIANTE A ASSUNÇÃO DAS OBRIGAÇÕES DECORRENTES. POSSIBILIDADE. PRECEDENTES. ACÓRDÃO EM HARMONIA COM A JURISPRUDÊNCIA DESTA CORTE. SÚMULA 83/STJ. USURPAÇÃO DE COMPETÊNCIA DA ANS. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULAS 282 E 356/STF. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO. 1. Não ficou configurada a violação ao art. 1.022 do CPC/2015, uma vez que o Tribunal de origem se manifestou de forma fundamentada sobre todas as questões necessárias para o deslinde da controvérsia. O mero inconformismo da parte com o julgamento contrário à sua pretensão não caracteriza falta de prestação jurisdicional. 2. De acordo com o entendimento da Terceira Turma, “falecendo o titular do plano de saúde coletivo, seja este empresarial ou por adesão, nasce para os dependentes já inscritos o direito de pleitear a sucessão da titularidade, nos termos dos arts. 30 ou 31 da Lei 9.656/1998, a depender da hipótese, desde que assumam o seu pagamento integral” (REsp 1.871.326/RS, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 01/09/2020, DJe 09/09/2020). Incidência da Súmula n. 83/STJ. 3. No que diz respeito à tese de usurpação de competência da ANS, incidem as Súmulas 282 e 356/STF, na espécie, porquanto ausente o prequestionamento. 4. Agravo interno desprovido.  (STJ – AgInt no AREsp: 1627179 SP 2019/0361377-3, Relator: Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, Data de Julgamento: 15/06/2021, T3 – TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 21/06/2021).

O entendimento, via de consequência, é adotado pelos tribunais pátrios:

Recursos de apelação. Plano de saúde. Cancelamento indevido. Ilegitimidade passiva da empregadora/ estipulante. Morte do titular. Danos morais configurados. Recurso adesivo. Majoração da indenização. Cabimento. Recurso apelatório interposto pelo Hospital Esperança S/A provido por unanimidade. Recurso apelatório interposto pela Bradesco Saúde S/A não provido por unanimidade. Recurso adesivo parcialmente provido por unanimidade (…)  3. Em caso de morte do titular, o direito de permanência é assegurado aos dependentes cobertos pelo plano ou seguro privado coletivo de assistência à saúde. Inteligência do art. 30, §3º, da Lei 9.656/98. […] (TJPE. AP 0031139-69.2019.8.17.2001. Rel. Des. Francisco Eduardo Gonçalves Sertório Canto. DJ 22/12/2021).

Feitas tais considerações, resta notória a necessidade de que você, enquanto beneficiário(a) de plano de saúde, esteja atento(a) às condições do seu contrato, devendo buscar, sempre que necessário, auxílio de profissional capacitado em direito da saúde para assegurar a manutenção do seu plano de saúde em caso de cancelamento indevido por parte da operadora.